Interpretação do conto de fadas “A Bela Adormecida” (Dra. Nise da Silveira adaptado)
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Essa é uma versão alternativa do conto que eu não conhecia…O rei e a rainha não tinham filhos e se entristeciam por não deixarem sucessores. Mas eis que uma rã anuncia à rainha um evento que trará nova vida àquele reino estagnado: nascerá uma princesa – diz o pequeno animal.
É freqüente que um período de esterilidade preceda o nascimento dos heróis, tal como aridez e depressão costumam anteceder fases de intensa atividade do inconsciente. Muitos artistas criadores já descreveram o fenômeno…
A rã é um animal que tem múltiplas conexões com a fertilidade. O coaxar das rãs anuncia a primavera, a exuberância da natureza, o desejo sexual.Nos tempos antigos, a rã era usada como amuleto para provocar amor e fecundidade. No conto, a rã, surgindo na água do banho, poderá mesmo ser subentendida como o órgão masculino que fecunda a rainha.
A rã, diz Jung, é entre os animais de sangue frio aquele que pelo aspecto de seu corpo tem maior semelhança com a forma humana. Impulsos do inconsciente, possuidores de forte carga energética que tendem a se tornarem conscientes, podem ser simbolizados pela rã. Algo do fundo do inconsciente vem à luz. Nasce a heroína do conto… Mas como tds sabem, ela é amaldiçoada à morte quando entrar na puberdade por uma bruxa que não havia sido convidada à sua festa de batismo. Uma fada reverte a maldição para um sono de 100 anos.
A morte pode ser entendida como a completa repressão do inconsciente. Já o sono durante um século indica que um longo período de repressão decorrera ainda antes que este conteúdo possa atingir a consciência. Que aspecto da natureza feminina tem sido mais reprimido na nossa civilização cristã? Sem dúvida, o da sexualidade.
Muito mais que sobre o homem, pesam sobre a mulher as sanções que obrigam a repressão do instinto sexual. Note-se que a heroína do conto adormece na data em que completa 15 anos, marco na vida de toda jovem e indicativo de que ela seria apta para a procriação. No dia de seu aniversário a princesa descobre a velha fiandeira cuja existência havia sido esquecida, tal como as 13 fadas com quem se identifica – motivo por que sua roca não fora destruída segundo as ordens do rei… E apenas ao segurar o fuso, fere o dedo.
O fiar está estreitamente vinculado à feminilidade. É atributo das deusas-mães que tecem a trama da vida e o destino, que sem cessar agrupam e organizam os elementos da natureza. O fuso, pela sua forma, tem características fálicas evidentes. Está sempre associado à roca como parte indispensável da atividade feminina de tecer novas vidas, tecer “os tecidos” do corpo.
Iniciar-se na arte de fiar significaria simbolicamente iniciar-se na vida sexual. A velha feiticeira instruiria a princesa, mas a iniciação desencadeia o castigo. O conto reflete, portanto, uma condição coletiva onde não só são negados à mulher direitos elementares em relação à sua vida instintiva como revela conexões entre a sexualidade feminina, o mal e o castigo – bem características da civilização patriarcal e cristã.
Esta situação coletiva causa estagnação no desenvolvimento da psique da mulher e produz reações agressivas forjadas pela sua componente masculina, reações que no conto se exprimem pela sebe de espinhos.
Cem anos mais tarde, chega o príncipe e diante dele os espinhos abrem caminho. Não é necessário sustentar luta contra quaisquer obstáculos. Daí a cem anos, num futuro distante, a situação coletiva refletida pelo conto mudará.
O conto nos revela que o príncipe, decidindo-se a ir em busca da Bela Adormecida, apesar dos conselhos contrários, rompe os laços familiares que o prendiam. Chegou o tempo de libertar a cativa, a mulher desconhecida, do sono em que a Mãe Terrível a mantém presa. Assim fazendo, ele está libertando sua própria contraparte feminina, o complemento de sua personalidade. Unindo-se à mulher que ele libertou, o herói cumpre o requisito para completar sua personalidade e estabelecer seu próprio reino.
Dra. von Franz, grande estudiosa dos contos de fadas de diversas culturas, chegou à conclusão de que todos esses contos descrevem o mesmo tema sob múltiplas variações: a busca da totalidade psíquica. Os diversos contos dão ênfase maior ou menor às diversas etapas desse processo em constante desdobramento.
“O conto reflete, portanto, uma condição coletiva onde não só são negados à mulher direitos elementares em relação à sua vida instintiva, como também revela conexões entre a sexualidade feminina, o mal e o castigo bem características da civilização patriarcal e cristã.” ( Dra. Nise da Silveira)
🐜Fontes🐜🐜:
🔸 Página Psicologia Profunda e Espiritualidade
🔸Página Zoemas
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