Alguém se aproximou – devia ser um vigia – olhou para eles e foi embora. Esse detalhe também lhe pareceu misterioso e belo. Via-se a chegada do vapor que vinha de Feodócia, iluminado pela aurora matutina e já de luzes apagadas.
Há orvalho sobre a relva – disse Anna Serguêievna, quebrando o silêncio. – É, já é hora de ir para casa.Voltaram para a cidade.Daí em diante, todos os dias eles se encontravam ao meio-dia na avenida à beira-mar, almoçavam juntos, passeavam, admiravam o mar. Ela se queixava de que dormia mal, de que seu coração batia de maneira angustiada, e fazia sempre as mesmas perguntas, preocupada ora pelo ciúme, ora pelo pavor de que ele não a respeitasse o suficiente. E frequentemente, na praça ou no jardim, quando não havia ninguém por perto, ele a puxava para si e a beijava com paixão. O ócio total, os beijos em plena luz do dia, cheios de cautela e do medo de que alguém os pudesse ver, o calor, o cheiro do mar, o perpassar incessante de pessoas bem- vestidas, festivas e bem-alimentadas pareciam havê-lo transformado. Ele dizia a Anna Serguêievna o quanto ela era bonita, sedutora; demonstrava uma paixão impaciente, não saía do seu lado; já ela, ficava muitas vezes pensativa e continuava a lhe pedir que reconhecesse que ele não a respeitava, não a amava nem um pouco e só via nela uma mulher vulgar. Quase todas as noites, mais tarde, eles iam para algum lugar fora da cidade, para Oreanda ou para a cachoeira. E o passeio era sempre um sucesso, as impressões eram invariavelmente maravilhosas, grandiosas. (A Dama e o Cachorrinho – Anton Tchecov)

📖Fonte: A Dama do Cachorrinho – Anton Tchecov🎥Filme “O Leitor”
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